SANTAYANA ESCREVE SOBRE A UNE




A atualidade da UNE


Mauro Santayana


Jornal do Brasil - 23/2/2007
O primeiro ato revelador do obscurantismo do movimento de 1964 foi o incêndio da sede da União Nacional dos Estudantes, nas primeiras horas do golpe. A UNE fora fundada em 1937 - em agosto fará 70 anos - e se destacara na defesa da liberdade e da soberania nacional. Em 1942, diante da agressão nazista aos navios brasileiros, no curso dos protestos que se seguiram, a UNE ocupou as dependências do Clube Germânia e ali instalou sua sede. Foi esse edifício que os vândalos destruíram pelo fogo em 1º de abril de 1964. Tratou-se de um auto-de-fé dos torquemadas contra o que a UNE representava naquele momento: o nacionalismo, a busca da igualdade, a denúncia da opressão, a pregação da esperança e a defesa de nossos recursos naturais, que vinha desde a campanha pelo petróleo.
Aos novos mandantes políticos era necessário, para garantir o poder discricionário, despolitizar a juventude, submetê-la ao "bom comportamento" e incentivar a busca do êxito individual, em lugar do combate coletivo. Um dos expedientes foi a mudança do sistema tradicional nas universidades brasileiras, que congregava os jovens em turmas, durante todo o curso. Ao dispersar os grupos, quebraram os vínculos de camaradagem dos estudantes, impediram as discussões ideológicas e a ação política.
Desde que se instituíram, em 1827, os cursos de direito no Brasil, as escolas superiores serviram para preparar os quadros políticos. Antes disso, os homens públicos brasileiros vinham da elite que podia mandar seus filhos estudar no estrangeiro. Foram jovens formados em Coimbra, em Paris e em Montpellier que ajudaram a fermentar o movimento da Inconfidência Mineira, participaram das conspirações da Independência e constituíram a primeira geração de estadistas do Império. Muito mais do que fazer profissionais, os centros universitários de São Paulo e do Recife - e, mais tarde, os do Rio de Janeiro, de Ouro Preto, de Belo Horizonte, de Salvador e de Porto Alegre - serviram para a formação de uma elite política, que podia ser conservadora ou liberal, mas cujos embates promoveram a organização nacional. Embora as faculdades de direito fossem as que se destacassem nesta formação de líderes, as de engenharia e de medicina, que se seguiram, tiveram papel importante já na campanha da abolição e na pregação republicana.
Muitas são as causas do depauperamento da qualidade dos homens públicos brasileiros, mas a repressão contra o movimento estudantil é a mais importante delas. Conhecidos homens públicos foram dirigentes da UNE, e o último dos presidentes da entidade, que a dirigiu no momento dramático da transição para a ditadura, é o governador de São Paulo, José Serra. Graças ao presidente Itamar Franco, a UNE recuperou o espaço da Praia do Flamengo, 132, que pertencia à União, de acordo com a lei que, ao ser declarada a guerra, confiscou os bens dos súditos do Eixo. Os estudantes pretendem erguer, naquele lugar, pleno de história, seu Centro Cultural, e Oscar Niemeyer lhes ofereceu o belo projeto arquitetônico.


Nota do blog: o espaço onde existia o prédio da UNE na praia do Flamengo é hoje um estacionamento e, apesar de várias liminares, o terreno ainda não foi definitivamente entregue a sua legítima proprietária: a UNIÂO NACIONAL DOS ESTUDANTES.


Veja matéria em : http://ultimainstancia.uol.com.br/noticia/37755.shtml
Nas fotos dois momentos: a passeata dos cem mil comandada pela UNE(1968) em plena ditadura militar(esquerda) e a recente ocupação do terreno da UNE (direita)

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